Roper Pires

A COMUNIDADE EPISTÊMICA COMO ESPAÇO DE PRODUÇÃO DE DISCURSOS E O LIVRO DIDÁTICO DE HISTÓRIA

Roper Pires de Carvalho Filho



Introdução

O conjunto de pesquisas sobre o livro didático, inicialmente restrito a focalizar o papel da ideologia nos manuais didáticos e a alguns aspectos históricos da educação brasileira tem se adensado no período recente, incorporando análises que buscam focalizá-lo em diferentes contextos. Ele é abordado como objeto inserido no contexto do processo de produção capitalista, que tem na indústria cultural uma importante fonte de recursos econômicos e de difusão de certa noção de cultura que circula entre os diversos segmentos sociais envolvidos na sua produção e consumo; ou ainda como texto impresso que veicula determinadas concepções teóricas.

Em estudos mais recentes, o livro didático também é analisado como material pedagógico utilizado pelo professor nas práticas que desenvolve com o objetivo de ensinar os alunos. Nesse sentido, o livro didático é um produto genuíno da cultura escolar, pois é um artefato pensado e materializado para atender às finalidades precípuas da educação escolar. Ele é incorporado às rotinas inerentes ao trabalho pedagógico do professor, e em alguns contextos educativos sobressai como o mais importante suporte das suas práticas, conformando a seleção dos conteúdos e métodos de ensino.

De acordo com Chopin (2004), o livro apresenta características únicas que o diferenciam das obras não didáticas: ele deve atender a uma clientela específica: a escolar. Sendo assim, o LD precisa ter uma linguagem (textual e gráfica) compreensível a essa clientela. No Brasil, a escolha do LD é uma atribuição do professor, com base em uma relação fornecida pelo INEP. Portanto, para conquistar a sua confiança quanto à utilidade desse material pedagógico para o processo ensino-aprendizagem, as editoras lançam mão de estratégias agressivas: visitas dos representantes comerciais às escolas e convite aos professores para participarem de palestras e workshops com os autores das obras didáticas (Cassiano: 2003). Quanto aos aspectos intrínsecos ao LD, para atender simultaneamente ao interesse do professor e do aluno, os textos, ilustrações, atividades e exercícios do LD são "escolarizados", isto é, passam por um arranjo que os torne adequados às exigências dos primeiros e com um conteúdo acessível aos últimos.
O livro didático enquanto objeto de investigação é um campo de estudos bastante diverso quanto às perspectivas de abordagem. No entanto, uma questão tem recebido pouca atenção na pauta das pesquisas referentes a esse campo: refiro-me à atuação de atores não estatais, que por meio da atuação em diferentes espaços sociais - muitas vezes com interesses contraditórios entre si - influenciam na produção das políticas públicas. Esses atores sociais têm em comum a destacada participação no seu campo de atuação, mediante a divulgação e circulação das suas ideias, discursos e ações (Beraldo e Oliveira, 2010), compondo o que vem sendo denominado por alguns autores de comunidade epistêmica (Ball: 2001; Lopes, 2006).
Em relação à política educacional em nível nacional, em específico ao que se relaciona aos processos de seleção do livro didático de História destinado às escolas públicas brasileiras, concordo com a premissa desses autores de que a comunidade epistêmica é formada por pesquisadores desse campo do conhecimento e por docentes que atuam nas instituições de ensino superior voltadas à formação dos professores dessa disciplina para a educação básica.
A presença marcante dessa comunidade pode ser notada principalmente por ocasião da sua participação nas comissões do PNLD - Plano Nacional do Livro Didático - que objetivam definir os critérios de seleção das coleções didáticas de História que irão compor o catálogo do Ministério da Educação, a ser submetido à apreciação dos professores da disciplina que atuam nas redes públicas de ensino do nível básico em todo o território nacional.
Sem desconsiderar o fato de que essa escolha movimenta enormes recursos econômicos e envolve na mesma teia as editoras e o governo federal - as primeiras, disputando a hegemonia do mercado, e o segundo, atuando como principal comprador das obras didáticas, vale afirmar que para além da esfera propriamente econômica, nos deparamos com disputas em torno de abordagens teóricas e questões historiográficas, que comparecem de maneira explícita ou difusa no PNLD.

Sendo assim, cabe perguntar até que ponto os critérios estabelecidos pela comunidade epistêmica formada pelos pesquisadores do livro didático de História e historiadores localizados na educação superior se articula às práticas e aos processos de reconstrução histórica pelos professores e alunos no cotidiano escolar, questão que não será possível responder por completo, visto não constituir o escopo dessa exposição. Por ora, tomando como base o PNLD 2013, contentar-me-ei em aclarar alguns dos critérios que ele estabelece para a seleção das coleções didáticas destinadas aos professores e alunos das redes públicas de ensino do país, em que enfatizo a participação da referida comunidade epistêmica.

O PNLD: Finalidades e critérios de seleção das coleções didáticas de História

A importância atribuída ao livro didático para o desenvolvimento das práticas educativas pode ser medida pelo alcance do Plano Nacional do Livro Didático, o PNLD, programa criado e mantido pelo Ministério da Educação. Esse programa tem por objetivo prover as escolas públicas de ensino fundamental e médio com livros didáticos e acervos de obras literárias, obras complementares e dicionários, sendo executado em ciclos trienais alternados. Assim, a cada ano o FNDE adquire e distribui livros para todos os alunos de determinada etapa de ensino e repõe e complementa os livros reutilizáveis para outras etapas. Para evitar algum imprevisto, a escola deve selecionar duas coleções. Assim, se a primeira opção selecionada não puder ser adquirida pelo PNLD, a escola receberá a segunda.

Outro objetivo do PNLD é orientar a seleção das coleções didáticas pelos professores, sua aquisição nas editoras e a distribuição dessas coleções para as escolas brasileiras. Essas orientações estão em concordância com as recomendações do Parecer CNE/CEB 11/2010, ao definir os processos de seleção e a forma de organização dos conteúdos no planejamento curricular:

No primeiro caso, é preciso considerar a relevância dos conteúdos selecionados para a vida dos alunos e para a continuidade de sua trajetória escolar. É também de fundamental importância que os conteúdos abordados respondam às demandas de um coletivo discente cada vez mais diverso, assegurando a igualdade de acesso ao conhecimento socialmente produzido. Em relação à organização dos conteúdos, é necessário superar o caráter fragmentário das áreas do conhecimento, integrando-as em currículo que possibilite tornar os conhecimentos abordados mais significativos para os educandos e favorecer a participação ativa de alunos com habilidades, experiências de vida e interesses muito diferentes (Portal do FNDE: Guia do Livro Didático 2013, p. 8).

Na seleção do livro didático, a presença de um ator: a comunidade epistêmica

Antes de chegar à escola, as coleções didáticas são submetidas à seleção prévia de avaliadores contratados pelo Ministério da Educação - MEC, a fim de garantir que essas coleções atendam aos parâmetros mínimos estabelecidos pelo PNLD. Somente depois de passar por esse processo e receber parecer favorável, as coleções didáticas podem ser adquiridas pelo MEC e enviadas às escolas.
A avaliação dos livros didáticos atende a princípios e critérios conformes à legislação vigente: assim, as coleções didáticas de História precisam, por exemplo, contemplar aspectos relacionados à diversidade étnico-cultural, à questão da cidadania, "à coerência e adequação da abordagem teórico-metodológica assumida pela coleção, no que diz respeito à proposta didático-pedagógica explicitada e aos objetivos visados, bem como à correção e atualização de conceitos, informações e procedimentos" (Guia do livro didático 2013, p. 12).

Em especial, os avaliadores manifestam preocupação com as obras didáticas que apresentam erros factuais e cronológicos ou que tratam de modo anacrônico e voluntarista, conceitos e fontes específicos à produção histórica. Em relação a esses dois últimos aspectos, considera-se:

O anacronismo consiste em atribuir razões ou sentimentos gerados no presente aos agentes históricos do passado, interpretando-se, assim, a História em função de critérios inadequados, como se os atuais fossem válidos para todas as épocas. Trata-se, com efeito, de distorção grave, que compromete totalmente a compreensão do processo histórico. O voluntarismo, por sua vez, consiste em aplicar a documentos e textos uma teoria a priori, em função do que se quer demonstrar. Dessa forma, a escrita da História é utilizada apenas para confirmar as explicações já existentes na mente da autoria, que parte de convicções estabelecidas por motivos ideológicos, religiosos ou pseudocientíficos. Pode, ainda, originar-se da tentativa da aplicação de teorias explicativas, tomadas acriticamente (PNLD 2013).

Se o trabalho dos avaliadores é a condição prévia evidente para que coleção didática chegue às escolas, outro aspecto desse trabalho permanece invisível: os avaliadores das coleções didáticas de História têm como principal campo de atuação o ensino superior como professores dos cursos de História. Eles fazem parte da comunidade de historiadores, que tem na Associação Nacional de História - a ANPUH - principal veículo de divulgação da produção científica do campo e espaço de atuação política, que repercute as posições dos historiadores em relação às questões acadêmicas e à História escolar.

Como foi possível observar em estudo sobre a produção das propostas curriculares (Carvalho Filho, 2015), a participação hegemônica desse grupo na avaliação no PNLD, busca garantir que os conceitos, princípios e maneiras de operar a reconstrução histórica pela ciência de referência sejam observados nas coleções didáticas, e ajude a nortear, via manual do professor, as práticas docentes na escola básica.

A análise dos critérios que nortearam a escolha da comissão de avaliadores das obras de História no PNLD permite apontar duas importantes características: a primeira é a ênfase nos vínculos desses profissionais com pesquisas ligadas ao livro didático e ao ensino de História; a segunda se refere à importância atribuída aos professores especialistas em histórias regionais e locais, o que se reflete na composição da comissão, formada por professores vinculados a instituições de ensino de todas as regiões do país. O perfil dos professores convidados para compor a equipe de avaliadores, informada no guia do PNLD, possibilita inferir que ela é formada por historiadores com destacada atuação acadêmica. O critério de escolha da equipe também evidencia o crescente interesse despertado pelo tema "ensino de História" na comunidade acadêmica, refletido na ampliação das linhas de pesquisas sobre o tema nos programas de pós-graduação por todo o país, no aumento da quantidade de trabalhos e na diversidade de temas propostos nos encontros específicos da área, além de denotar a forte presença desses profissionais nas questões educacionais.

A atuação dos historiadores-avaliadores pode ser caracterizada como típica de uma comunidade epistêmica (BALL, 2001; LOPES, 2006), em que profissionais de um determinado campo do conhecimento, mediante diversas estratégias procuram manter ou ampliar a hegemonia desse campo. No caso em questão, está em jogo a preservação dos saberes canônicos da ciência de referência - a História acadêmica - nos manuais didáticos, por meio da inclusão ou exclusão das obras que não se conformem aos critérios definidos no guia do PNLD.

A formulação dos critérios utilizados pelo PNLD para a seleção das coleções didáticas, além dos aspectos abarcados pela legislação, também tem a ver com as disputas travadas pelos historiadores em torno do espaço da História no currículo escolar, bem como o espaço de determinada concepção de História nesse currículo e nas coleções didáticas. Assim, a presença de grupo de historiadores vinculados a determinada concepção de ensino e de História, nas esferas de decisão relacionadas às políticas curriculares, e que se estende aos processos de avaliação das obras didáticas, expressa a hegemonia desse grupo nas discussões do campo.

A análise dos documentos curriculares e outros documentos oficiais evidencia a presença de sujeitos e grupos que, em diferentes momentos, atuaram com o objetivo de influenciar as disputas em torno das políticas curriculares para a História ensinada nas escolas. Tais disputas envolvem processos de negociações em que está em jogo é o status de determinados saberes e disciplinas no arranjo curricular. Nesse contexto,

Os textos oficiais são espaços privilegiados de manifestação desses embates, dentro das comunidades disciplinares, pois atuam como legitimadores do conhecimento a ser ensinado, contando tanto com seus significados simbólicos quanto práticos. Essas disputas podem se estabelecer em torno da seleção de conteúdos, da abordagem filosófica e de outros aspectos de ordem prática como carga horária e distribuição de recursos (ALVES, 2011, p. 29).

O emprego da metáfora "territórios em disputa" se presta para situar o currículo e o livro didático como espaços sociais onde se trava o jogo de forças em torno dos sentidos e significados pelo qual determinada abordagem se torna hegemônica na área de conhecimento, e de como isso se reflete no contexto de produção de textos e orientações curriculares pelo poder central. Nesse sentido, dada a dimensão dos interesses econômicos e disputas por prestígio no âmbito acadêmico que envolve, o PNLD é um componente fundamental dessas disputas.

Alves (op. cit.) informa que os últimos ciclos de avaliação promovidos pelo PNLD têm se caracterizado pelo rigor dos avaliadores em relação aos aspectos teórico-metodológicos e conceituais das obras didáticas. A "transposição" desses aspectos para o livro didático implica, por parte dos editores e autores, referenciar-se nas orientações dos avaliadores, e por extensão, na política curricular oficial, da qual o PNLD é um dos principais instrumentos.

Nesse contexto, programas de aquisição de material didático como o PNLD, "desempenhariam simultaneamente funções relacionadas: à formação profissional dos professores e à configuração de matrizes curriculares" (idem, p. 31), alem da evidenciar a relação assimétrica entre o conhecimento acadêmico e o saber docente, com o predomínio do primeiro.

No âmbito escolar, pela importância atribuída ao livro didático no cotidiano de trabalho dos professores, a obra selecionada influencia, em maior ou menor grau, o contexto das práticas, em que "as definições curriculares são incorporadas e reinterpretadas para constituir-se tanto na materialidade da obra produzida com a finalidade de atender ao PNLD, quanto no uso efetivo que os professores podem fazer destes livros, em suas salas de aula" (idem, p. 29).

Referências

ALVES, Irene de Barcelos. Entre regulação e persuasão: a política curricular para o livro didático de Geografia dos anos iniciais do Ensino Fundamental no PNLD 2010.  Dissertação de mestrado. Rio de Janeiro: 2011.
BALL, Stephen J. Cidadania global, consumo e política educacional. In: SILVA, Luiz Heron. A escola cidadã no contexto da globalização, p. 121-137. Petrópolis, RJ: Editora Vozes, 2001.
BERALDO, Tânia Maria Lima; OLIVEIRA, Ozerina Victor. Comunidades epistêmicas e desafios da representação nas políticas curriculares do curso de pedagogia. Revista Teias v. 11 * n. 22 * p. 113-132 * maio/agosto 2010.
CARVALHO FILHO, Roper Pires de. Currículo e ensino de História em uma escola da rede municipal de São Paulo: entre prescrições e práticas. Tese de doutorado. São Paulo: Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo, 2015.
CASSIANO, Célia Cristina de Figueiredo. Aspectos políticos e econômicos da circulação do livro didático de História e suas implicações curriculares. Revista História, São Paulo, v. 23, p. 33-48: 2004. In: 
CHOPIN, Alain. História dos livros e das edições didáticas: sobre o estado da arte. Educação e Pesquisa. São Paulo, v. 30, n. 3, p. 549-566, set/dez. 2004.

LOPES, Alice Casimiro Currículo sem Fronteiras, v.6, n.2, pp.33-52, Jul/Dez 2006 Discursos nas políticas de currículo. Universidade do Estado do Rio de Janeiro Rio de Janeiro, Brasil.

5 comentários:

  1. Boa noite,
    O apontamento sobre a questão do anacronismo presente nos livros didáticos, se refere a uma questão política? Há alguma perspectiva de mudança de rumos?
    Ass.: Thiago Phelippe Abbeg

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    1. Boa noite Thiago,
      A crítica dos avaliadores do PNLD em relação ao anacronismo histórico diz respeito à veiculação de informações contendo erros factuais, datação inexata, etc. Além desse aspecto, os avaliadores também existe a questão política, quando os avaliadores fazem a discussão de uma coleção didática em que a questão "temporalidade" assume a posição de eixo ordenador da narrativa histórica (o tempo cronológico organizando a narrativa ou agrupando a narrativa em eixos temáticos, por exemplo). São escolhas que vão estruturar a narrativa histórica no livro didático, portanto, dizem respeito a formas de organizar o discurso, e, portanto, as formas de pensar historicamente dos professores e alunos que atuam na educação básica.
      Em específico à questão das temporalidades na narrativa histórica, sugiro que você faça uma visita à página da ANPUH, grupo de trabalho "Ensino de História e Educação", grupo de discussão. Lá você encontrará o texto elaborado pelos autores do BNCC - Base Nacional Curricular Comum - que discute concepções de História, temporalidade, e questões historiográficas.
      Um abraço.

      Roper

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  2. Em algumas discussões em que estive presente, inquietações foram levantadas quanto ao livro didático, neste sentido, gostaria que se possível você comentasse sobre elas:
    - se há tantos debates sobre o ensino, por que é tão difícil encontrar livros que tragam diferentes fontes para pensar a história, formação do conhecimento crítico e cidadania? Muitos livros trazem em sua apresentação esses objetivos, mas em seu corpo textual deixa essa a desejar...
    - por que ainda há nos livros 'falas', anacronismos e conceitos que foram considerados 'superados' pela historiografia?
    - como pensar o sujeito histórico, o respeito/tolerância acerca das diferentes culturas e povos através de materiais que trazem os aspectos políticos e econômicos? Entendo que o livro é um suporte para a aula, mas que tipo de suporte pode oferecer com informações tão limitadas? Por que parece que tão pouco é feito para o 'avanço' do conhecimento?
    Sei que mencionou que a escolha dos livros recai aos professores, mas quais são as suas opções? Sempre que pego um livro de alguma escola, vejo poucas mudanças aos livros que usava enquanto aluna, entende?

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    1. Bom dia Jessica,


      Na perspectiva analítica que utilizo no texto, o livro didático é um artefato cultural inscrito nas práticas específicas daqueles que o constrói. Entendo essa construção como um processo marcado por disputas entre sujeitos com diferentes interesses: a perspectiva histórica do autor e dos avaliadores, o interesse dos editores em vender a coleção didática, etc. De certo modo, o livro didático que o professor seleciona já foi pré-selecionado, portanto, o professor vai escolher não a melhor coleção, mas a que está disponível no catálogo e melhor se aproxime das suas práticas com os alunos, apesar das limitações que encontre (por ex., o desencontro entre objetivos anunciados e conteúdo ou metodologia); anacronismos e erros factuais podem ocorrer por diferentes razões: descuido dos autores, editores, revisores, diagramadores (por ex., identificação equivocada de uma imagem, troca de datas...), escolhas teóricas, boa aceitação entre os "consumidores" (há o caso de uma coleção didática, do Borges Hermida, editada desde a década de 1950, que até recentemente era best seller da editora);como você mesmo afirma, o livro didático é um suporte para a aula, em que pese suas limitações. No entanto, defendo que a sala de aula é um espaço privilegiado em que o professor dispõe de grande autonomia para fazer o seu trabalho e avançar no conhecimento histórico, preferencialmente, discutindo o próprio livro didático com os seus alunos. A maneira como o professor constrói o processo de ensino, e como utiliza o livro didático didático nesse processo, depende das informações prévias que ele, professor traz da sua formação acadêmica, experiência na docência, etc; está certo que os livros mudam pouco, por diversas razões fica caro para as editoras produzir uma coleção e descartá-la no ano seguinte por outra mais "moderna". Outro aspecto diz respeito à maneira pela qual o conhecimento histórico produzido pelos acadêmicos é apropriado pela escola. De acordo com diversos estudos (Andre Chervel, Circe Bittencourt...), o conhecimento histórico presente no livro didático e nas aulas de História do ensino básico é bastante diferente do chamado saber erudito. Podemos dizer que ao ser "escolarizado", o conhecimento histórico passa por adequações, com a finalidade de servir ao público escolar. Enfim, penso que nenhum livro didático é capaz de dar conta de "toda a História", o que deixa ao professor uma margem de autonomia pouco vista em outras categorias profissionais.

      Espero ter contribuído para a sua reflexão.

      Um abraço,
      Roper

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    2. Bom dia Jessica,


      Na perspectiva analítica que utilizo no texto, o livro didático é um artefato cultural inscrito nas práticas específicas daqueles que o constrói. Entendo essa construção como um processo marcado por disputas entre sujeitos com diferentes interesses: a perspectiva histórica do autor e dos avaliadores, o interesse dos editores em vender a coleção didática, etc. De certo modo, o livro didático que o professor seleciona já foi pré-selecionado, portanto, o professor vai escolher não a melhor coleção, mas a que está disponível no catálogo e melhor se aproxime das suas práticas com os alunos, apesar das limitações que encontre (por ex., o desencontro entre objetivos anunciados e conteúdo ou metodologia); anacronismos e erros factuais podem ocorrer por diferentes razões: descuido dos autores, editores, revisores, diagramadores (por ex., identificação equivocada de uma imagem, troca de datas...), escolhas teóricas, boa aceitação entre os "consumidores" (há o caso de uma coleção didática, do Borges Hermida, editada desde a década de 1950, que até recentemente era best seller da editora);como você mesmo afirma, o livro didático é um suporte para a aula, em que pese suas limitações. No entanto, defendo que a sala de aula é um espaço privilegiado em que o professor dispõe de grande autonomia para fazer o seu trabalho e avançar no conhecimento histórico, preferencialmente, discutindo o próprio livro didático com os seus alunos. A maneira como o professor constrói o processo de ensino, e como utiliza o livro didático didático nesse processo, depende das informações prévias que ele, professor traz da sua formação acadêmica, experiência na docência, etc; está certo que os livros mudam pouco, por diversas razões fica caro para as editoras produzir uma coleção e descartá-la no ano seguinte por outra mais "moderna". Outro aspecto diz respeito à maneira pela qual o conhecimento histórico produzido pelos acadêmicos é apropriado pela escola. De acordo com diversos estudos (Andre Chervel, Circe Bittencourt...), o conhecimento histórico presente no livro didático e nas aulas de História do ensino básico é bastante diferente do chamado saber erudito. Podemos dizer que ao ser "escolarizado", o conhecimento histórico passa por adequações, com a finalidade de servir ao público escolar. Enfim, penso que nenhum livro didático é capaz de dar conta de "toda a História", o que deixa ao professor uma margem de autonomia pouco vista em outras categorias profissionais.

      Espero ter contribuído para a sua reflexão.

      Um abraço,
      Roper

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