Vinicius Augusto e Luis Barnabé

CONCEPÇÕES DE REPÚBLICA E CIDADANIA NA ROMA ANTIGA E NA SOCIEDADE ATUAL: ANÁLISE DE LIVROS DIDÁTICOS CONTEMPORÂNEOS

Vinícius Augusto do Prado Furtado
Luís Ernesto Barnabé



Introdução

Em busca de uma compreensão melhor sobre como o mundo antigo é retratado nos livros didáticos atuais, como ponto norteador, procuramos nesta pesquisa que está em andamento identificar e comparar conceitos da República romana, da participação popular, da cidadania e do direito. O ponto de partida para essa pesquisa vem das considerações de Norberto Guarinello (2014), que procura explicar a História Antiga e a memória social, "Desde o século XIX, a "ocidentalização de nossa História e de nossa memória foi um projeto consciente do Estado brasileiro e de nossas elites" (GUARINELLO, 2013 p. 7).

E entender como está sendo retratado o período da Roma Antiga é de necessidade por, muitas vezes ser a formadora de pensamentos eurocêntricos, "sem nos darmos conta, para o bem e para o mal, a História Antiga nos ocidentaliza" Guarinello (2013, p.13), assim podendo cair no anacronismo ou em uma história tradicional.

Mas o porquê fazer uma pesquisa de analise os livros didáticos? Eles são responsáveis por inúmeros fatores para a busca na qual estamos fazendo, eles acabam sendo artefatos culturais complexos, são responsáveis por auxiliar na transmissão de conhecimento, e "se considerarmos a quem se destinam os livros didáticos (professores, alunos e indiretamente pais), a influência de valores da sociedade atual, muito arraigados na população torna-se relevante" (BARNABÉ, 2014 p. 217)

"Trata-se de ruptura com as máximas da pedagogia humanista ilustrada de formar homens, mas que não significa um abandono dos estudos da Antiguidade. Ao contrário, esta está mais viva ainda, principalmente pela busca desenfreada dos Estados nacionais europeus pela herança clássica..." (BARNABÉ, 2014 p. 221/122)

Um ponto que vem sendo discutido sobre os livros didáticos é a influência que ele recebe em seu processo de construção, há muitos meios que interferem na escrita deste, as editoras, o estado, a sociedade, o autor, seu público e a cultura

Os livros didáticos de História não são escritos apenas a partir da, mas na cultura e, por seguinte, no conflito, pois o cultural e o social são indissociáveis e é inerente ao ensino de História uma conectividade intensa às demandas sociais, as quais reflete e refrata ao mesmo tempo (MORENO, 2014, p. 55,)

As opiniões que surgem, implicam na escrita livro didático, algum órgão pode vetar o "novo" conteúdo que apareceria nele, uma vez que o livro didático é um produto.

Para efetuar a transformação de um material didático no produto de maior consumo da cultura escolar, os editores associaram-se ao Estado, engendrando atuações conjuntas em suas formas de circulação. Estabeleceram-se entre ambos tramas, por intermédio das quais o livro didático disseminou-se no quotidiano escolar, transformando-se no principal instrumento do professor na transmissão do saber. (BITTENCOURT, 2008, p.78)

Os produtores (Autor, Estado, editora, sociedade) podem não querer passar uma nova forma de abordagem que está no livro por um desconhecimento que pode estar ligado a em linhagens tradicionais, na formação mais antiga, uma vez que estaria diferente ou contraditório ao que ele conhece, a visão tradicional ainda está embutida na sociedade

Concepções tradicionais permanecem, em termos de conteúdo e concepção histórica nos livros didáticos, alimentadas por forças intrínsecas às disputas dentro do campo, as quais nem sempre requerem o que poderíamos chamar de capital simbólico acadêmico, em detrimento de outros "capitais" que, por exemplo, protegem uma editora ante a um fracasso editorial. (BARNABÉ, 2014 p. 227)

As pesquisas feitas e o conteúdo exposto nas universidades são em grande maioria diferentes dos passados para as escolas de educação fundamental. Alguns autores ou editoras às vezes optam por manter um sistema tradicional para que se tenha a venda certa e que estejam nas escolas. "A meta das editoras é sempre ter um produto de circulação nacional tornando mais favorável a equação entre o custo de produção e o tamanho do mercado" (MORENO, 2014, p.247).

Neste sentido, também é importante salientar que os livros didáticos sofreram significativas transformações nos anos de 1990 em decorrência tanto das inovações tecnológicas quanto das reformas curriculares pelo mundo todo. Especificamente no caso brasileiro, recentemente redemocratizado, como a atuação do Estado brasileiro através dos princípios de universalização do Ensino, da inclusão de etnias e minorias presentes na constituição de 1988, na LDB de 1996, nos PCNs de 1997 e no PNLD. Além da universalização, o teor destes documentos oficiais comprova a tendência de revisão formal e de conteúdos em diversas disciplinas. De maneira geral, democracia, cidadania e o mundo do trabalho ganham destaque. O PCN História (2001, p.46) afirma que uma das intenções que os conteúdos expressam é "favorecer o conhecimento de diversas sociedades historicamente constituídas, por meio de estudos que considerem múltiplas temporalidades".

A abordagem de Roma nos livros didáticos

Serão analisados neste momento doze livros aprovados pelo PNLD 2014, destinados ao 6º ano do Ensino Fundamental:

[Livros | Título | Autor (es) | Editora]
1.Jornada.hist | Maria Luísa Vaz; Silvia Panazzo | Saraiva
2.Saber e  fazer História | Gilberto Cotrim; Jaime Rodrigues | Saraiva
3.Leituras da História | Oldimar Cardoso | Escala Educacional
4.Por Dentro da História | Pedro Santiago; Célia Serqueira; Maria Aparecida Pontes | Escala Educacional
5.Encontros com a História | Vanise Ribeiro; Carla Anastásia | Positivo
6.História Sociedade & Cidadania ed. Reformulada | Alfredo Boulos Júnior | FTD
7.Projeto Araribá | Maria Raquel Apolinário | Moderna
8.Projeto Radix | Cláudio Vicentino | Scipione
9.Perspectiva História | Renato Mocellin; Rosiane de Camargo | Brasil
10.Projeto Teláris | Gislaine Azevedo; Reginaldo Seriacopi | Ática
11.Coleção Link | Denise Mattos Mariano; Léo Stampacchio | IBEP

Os livros didáticos têm similaridades comuns, mas outros optam por diferentes abordagens, temas principais e secundários, o objetivo é identificar estes pontos dos livros da tabela 1.

A análise feita nos livros didáticos tem como objetivo identificar as relações estabelecidas pelos autores entre Roma e a atualidade brasileira: republica, direito e cidadania.

No decorrer da identificação do material, foi possível observar pequenos fatores similares ou diferentes, um exemplo seria a similaridade dos livros na abordagem do significado de "a coisa pública" em Jornadas.hist , Saber e fazer História), Encontros com a História, Projeto Radix, Leituras da História, Perspectiva História.

Em outro caso temos a Coleção Link, com ordem temática, alguns abordam em um capitulo especifico o Império e após falam sobre a cultura romana, são eles: Por dentro da História, História, Sociedade e Cultura. O livro Projeto Araribá traz a cultura e sociedade antes do império. Leituras da História aborda com um capítulo exclusivo o cristianismo e opta por não falar da sociedade em seu cotidiano.

Alguns até optam por fazer o diferente, como o caso do livro Projeto Teláris ele encurta a abordagem tradicional das três fases políticas para se ater a aspectos do funcionamento da sociedade romana, o autor prefere buscar na sociedade e nas obras arquitetônicas explicar como era o funcionamento de Roma, ao explicar por exemplo como era o templo dos deuses ele direciona o leitor a ver como a população se portava nos templos, suas crenças, etc.

Considerações finais

Ainda é cedo para fazer conclusões, pois o projeto está em andamento. Dentre alguns pontos que foram notados até agora, é que há uma quantidade menor da tradição de narrativa de feitos políticos que os livros didáticos costumavam apresentar. Por exemplo, destacaríamos a citação de Plutarco acerca de Tibério Graco, somente encontrada em um exemplar (Perspectiva História).

A busca por conhecimento e entendimento do passado muitas vezes nos remete a coincidências com o tempo atual, para não cair em um erro grotesco, colocamos a princípio que as sociedades não são cópias ou tem uma herança e sim que as pessoas da atualidade buscam no passado meios para adaptar e modifica-los para montar uma sociedade mais completa e melhor, a pesquisa sobre a Roma Antiga feita nos livros didáticos, tem por "pensar sobre a História antiga é uma maneira de pensarmos o repensarmos nosso lugar em um mundo de rápidas transformações" GUARINELLO, 2013 p. 8)

Referências

Livros didáticos
ANASTASIA, Carla. RIBEIRO, Vanise. Encontros com a História. Curitiba: Positivo, 2012.
APOLINÁRIO, Maria Raquel. Projeto Araribá: História. São Paulo: Moderna, 2012.
AZEVEDO, Gislane. SERIACOPI, Reinaldo. Projeto Teláris: História São Paulo: Ática, 2012.
BOULOS, Alfredo Júnior. História sociedade e cidadania. São Paulo: FTD, 2012.
CARDOSO, Oldimar. Leitura da História. São Paulo: Escala educacional, 2012.
COTRIM, Gilberto. RODRIGUES, Jaime. Saber e fazer História, 2012.
DE CAMARGO, Rosiane. MOCELLIN, Renato. Perspectiva história. São Paulo: Editora do Brasil, 2012.
MARINO, Denise. STAMPACCHIO, Léo. Coleção Link: História. São Paulo: IBEP, 2012
PANAZZO, Silvia. VAZ, Maria Luísa. Jornadas. hist. São Paulo: Saraiva, 2012.
SANTIAGO, Pedro. CERQUEIRA, Célia. PONTES, Maria Aparecida. Por dentro da história. São Paulo: Escala Educacional, 2012.
VICENTINO, Claudio. Projeto Radix: história. São Paulo: Scipione, 2012.

Referências bibliográficas
BITTENCOURT, Circe Maria Fernandes. Livro didático e saber escolar (1810-1910) Belo Horizonte: Autêntica, 2008.
GUARINELLO, Noberto Luiz. História antiga. São Paulo: Contexto, 2013.
MORENO, Jean Carlos. Quem Somos Nós. Apropriações e Representações sobre a (s) Identidade (s) Brasileira (s) em Livros didáticos de História (1971-2001). Jundiaí: Paco Editorial, 2014
BARNABÉ, Luís Ernesto. De olho no presente: História Antiga e livros didáticos no século XXI DOI 10. 5216/o. v14i2. 30829. OPSIS, v. 14, n. 2, p. 114-132, 2014.


4 comentários:

  1. Em seu texto, na sua conclusão você assinala que "A busca por conhecimento e entendimento do passado muitas vezes nos remete a coincidências com o tempo atual", poderia exemplificar melhor o que seriam tais coincidências atuais?

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    1. Vinícius Augusto do Prado Furtado11 de março de 2016 às 11:46

      Seria dos conceitos, como a República, Direito, Reforma Agraria, que são retratados no período antigo e no tempo atual, e em alguns casos tratam estes conceitos como "herança" daquele tempo para o dias de hoje.

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  2. Vinícius e Luís, boa noite
    Parabéns pelo trabalho. Minha área de pesquisa é Roma Republicana (embora não ensino), então, me interesso muito pelo assunto. Se me permitem, tenho duas perguntas:
    1) Quando vocês falam que há uma quantidade menor de narrativa de feitos políticos em relação a obras anteriores, vocês definiram (na pesquisa) uma época específica para efetuar essa comparação?
    2) Já foi possível identificar alguma(s) estratégia(s) recorrente(s) utilizada(s) pelos livros para evidenciar a associação entre Roma x realidade brasileira atual?
    Gisele Oliveira Ayres Barbosa

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    1. Vinícius Augusto do Prado Furtado11 de março de 2016 às 12:07

      Boa tarde Gisele, obrigado!
      1- A época do recorte principal é durante a República romana, mas nas tabelas feitas, o recorte passa sobre a Monarquia, a República e o Império de Roma, no qual nos Livros Didáticos percebe-se bastante diferença de um para o outro.

      2- Sim, no livro "Jornada.hist" por exemplo tem um box, falando sobre a reforma agraria de Roma e a do Brasil.
      E no livro "Leituras da Historia" traz logo no começo do capitulo referente a Roma, o brasão de armas nacionais do Brasil, fazendo relações entre a República romana e a forma de governo republicana do Brasil.

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