Rafael Hoffman

PRÁTICAS DOCENTES E A FORMAÇÃO DA CONSCIÊNCIA CRÍTICA

Rafael Moura Hoffmann



Este trabalho foi desenvolvido com base nas práticas do estágio supervisionado do ano de 2015, onde decidi pela utilização de autores com caráter mais pedagógico do que uma teoria focada na pesquisa histórica, pois se tratando de um estágio em sala de aula, julgo importante enfatizar teorias que dão importância ao desenvolvimento do aluno. Apesar de importante, apenas o conhecimento científico não é suficiente para o desenvolvimento de um bom profissional, como afirma Freire (2005).

Os saberes escolar e acadêmico são diferentes, e por muitas vezes o que é aprendido na academia acaba se distanciando das escolas, mas o ideal é mantê-los próximos. É de extrema importância utilizar a metodologia e teoria aprendidas durante a graduação nas atividades desenvolvidas na sala de aula escolar e somente com uma boa base teórica o professor conseguirá organizar e administrar com perspicácia seus conteúdos (SEFFNER, 2000).

É de grande importância a afirmação de Paulo Freire (2005, p. 21) “não há docência sem discência”, pois sempre ao ensinar um tema você precisa estudá-lo e aprendê-lo. Enquanto o processo de ensino é aplicado, o professor também está recebendo conhecimento pelo seu aluno através do seu conhecimento prévio. A troca de informações é constante em sala de aula e o aluno também estimula o professor nas pesquisas.

Ensinar inexiste sem aprender e vice-versa e foi aprendendo socialmente que, historicamente, mulheres e homens descobriram que era possível ensinar. Foi assim, socialmente aprendendo, que ao longo dos tempos mulheres e homens perceberam que era possível – depois, preciso – trabalhar maneiras, caminhos, métodos de ensinar. (FREIRE, 2005, p. 23-24)

Aprender a aprender para aprender a ensinar, mesmo porque enquanto está ensinando, nunca para de se receber conhecimento. O bom profissional da educação deve sempre priorizar a Ética Universal do ser humano proposta por Freire (2005). Ser justo, agindo sem preconceito, respeitando o conhecimento do aluno e o que ele traz de seu meio através das suas experiências.

A ética de que falo é a que se sabe traída e negada nos comportamentos grosseiramente imorais como na perversão hipócrita da pureza em puritanismo. A ética de que falo é a que se sabe afrontada na manifestação discriminatória de raça, de gênero, de classe. É por esta ética inseparável da prática educativa, não importa se trabalhamos com crianças, jovens ou com adultos, que devemos lutar. (FREIRE, 2005, p. 16)

Sempre deve ocorrer o tratamento em igualdade entre os alunos, independente de inteligência ou qualquer outro critério. Dar mais atenção para determinado aluno por ter um melhor desempenho em avaliações ou participação deve ser uma prática abolida da atividade docente. Muitas vezes medir a inteligência de um aluno pode ser complicado, pois enquanto um aluno se destaca nas discussões orais, outro pode ter maior desempenho em exercícios escritos. Não há como dizer que um é mais inteligente que o outro.

Fica a cargo do professor muito do que é proferido do conteúdo, mas deve haver uma conscientização na seleção dos conteúdos. Muito do que já vem pronto vem de uma classe que está no poder, e nós podemos filtrar o que é mais importante para o nosso aluno. É importante manter na escola um sentimento de troca de experiência e prazer em dar aula, pois se isso faltar tudo vira um processo mecânico e sem interação.  Dessa forma seria melhor o aluno ler um texto por conta própria, pois o professor não teria utilidade.

Assim como o conteúdo deve ser manipulado de acordo com a realidade escolar, o uso de diversas formas de material didático deve ser explorado para tornar a aula mais dinâmica e agradável, tanto para o aluno quanto para os professores. O discente deve ser inserido no processo de construção do conhecimento histórico. Para isso, como ponto de partida, o conhecimento do aluno tem que ser explorado. O ideal é adaptar as metodologias de ensino de acordo com o conhecimento prévio apresentado pelo educando, assim como a realidade dos alunos, do local e da comunidade em que se encontra a instituição de ensino.

O ensino teórico cronológico, usado anteriormente, não prende a atenção do aluno. E quando a aula se torna monótona, dificilmente haverá bom resultado no aprendizado, pois sem interesse na aula não há possibilidade de adquirir o conhecimento. O ensino cronológico, método baseado em uma construção do tempo histórico homogêneo, com base no eurocentrismo, encontra-se superado para alguns autores. De acordo com Turini (2004) esta visão deve ser modificada, focando-se em eixos temáticos ao invés de cronológicos. O ensino se torna mais lógico e é possível ligar os conteúdos, facilitando a assimilação para os alunos e norteando a temática com a vivência e cotidiano do aluno.

Uma discussão sobre o tema de tempo histórico foi levada aos Parâmetros Curriculares Nacionais nos anos 90, mas causou mais confusão do que ajudou no ensino. Ele foi relacionado na grade sem o contexto correto e simplesmente colocado como conteúdo em sala de aula.

É difícil fugir totalmente do eixo eurocêntrico de organização temporal, o tema está na antiguidade, e esta antiguidade já vem do quadripartismo europeu.

Essa premissa hoje é extremamente questionável por não levar em conta a diversidade, a multiplicidade de tempos, a especificidade de cada realidade social e cultural. Além do mais, como frisa o autor, ao estabelecer a divisão entre História Antiga, Medieval, Moderna e Contemporânea, em uma perspectiva eurocêntrica, a periodização quadripartite desconsidera, muitas vezes, a história de povos não europeus. (TURINI, 2004, p. 98)

Outra questão relacionada ao problema com o tempo é a crença em uma evolução linear de acordo com a temporalidade, se tornando vã a ideia de considerar a evolução de uma sociedade pelo período em que viveu. Na aula referente a Filosofia e Ciências, usei alguns exemplos de outras sociedades que estavam desenvolvendo a chamada “razão” para explicar alguns fatos religiosos. Mesmo estas sociedades sendo consideradas primitivas em comparação a Grécia, estavam vivendo o mesmo momento cronológico. Logo, para melhorar o desenvolvimento dos alunos é melhor superar o ensino teórico cronológico e trabalhar com eixos temáticos, mantendo o tema próximo do aluno e não privilegiando nenhuma região como superior e evoluída em comparação a outras.

Conseguindo a atenção, o trabalho vai para ensinar o aluno a levantar problemas, desenvolver o senso crítico e não só ficar naquele texto pronto do livro, deixar o aluno participar do processo do fazer a história. Em Pedagogia do Oprimido, Freire (1981) chama a atenção para uma educação problematizadora, em que ao ensinar não se transfere o conhecimento, mas sim compartilha-se a experiência para construir o ser crítico, é um diálogo entre professor e aluno.

Mostrar que o conhecimento não é um dom, é normal surgir na sala de aula a frase: “não consigo, não dou certo em história”, isso porque o ensino está desfalcado em algum momento, faltando trabalhar com o próprio conhecimento do aluno e mostrar a compreensão do processo, cair nos saberes do aluno. A construção do conhecimento é dada por vários saberes, sendo saberes da disciplina, do aluno, da experiência, e não apenas do professor.

Os espaços nos educam, a leitura de romances nos educa, os objetos educam nossos corpos, os modos de lecionar História nos educa tanto quanto o que é dito (ou silenciado) nas aulas. (SEFFNER, 2000, p. 264).

A informação é o que o aluno tem normalmente, é o que está presente no seu cotidiano, na internet, na televisão, etc. Mas fica nas mãos do professor a transformação de um conteúdo para a linguagem acessível do aluno, tornando a ele interessante. É preciso ter conhecimento sobre o assunto e estar claro o que será ensinado. O passado deve ser interrogado a partir de questões existentes no presente, fazendo um link com problemas atuais, caso contrário o tema pode ficar sem sentido para o aluno.

Será possível utilizar tudo que está no papel nas atividades práticas? Em sala de aula eu tentei manter a prática da teoria, e digo que é possível sim a aplicação do que foi citado acima. Mas devo ressaltar, sempre que lemos um autor falando dos alunos, eles os tratam como uma só entidade, o que é complicado porque os alunos não agem da mesma forma, cada um tem sua personalidade específica, o que é possível e facilmente trabalhado com tal aluno, com o outro pode ser complicado.

Considerei de grande importância o diálogo com os discentes, dar espaço para que eles tivessem voz nas aulas, é uma metodologia que desenvolve muito a relação docente/discente. Tanto em conhecer o aluno, como também para colocar em prática o que Freire (2005), Schmidt e Cainelli (2005) afirmam.

O maior tempo de estágio em uma sala de aula são 12 aulas, o que é um tempo curto para conhecer os alunos, que acredito ser de fundamental importância para desenvolver ou identificar a melhor metodologia de trabalho. Um exemplo é alguns detalhes que tive que alterar na aplicação das aulas, ao produzir o plano de aula ainda não tinha contato com os alunos e foram pensadas as aulas de uma maneira, mas ao ter contato percebeu-se a necessidade de tais alterações, e ao fim das 12 aulas se fosse aplicado uma segunda vez haveria mais alterações pelo pouco que foi conhecido da turma.

Escrevo 12 aulas, excluindo o período de coparticipação, pois durante estas aulas raramente se tem um contato maior com os alunos. Há um contato muito superficial, mesmo que haja interação, auxílio ao professor supervisor, o acadêmico ao olhar dos alunos está apenas observando e não tem autoridade neste momento. Isto pode prejudicar na regência, pois o primeiro contato com o aluno foi sem autoridade.

Lembrando que cada aluno tem seu próprio perfil, utilizei a proposta presente em Schmidt e Cainelli (2005), várias atividades focando cada uma em um método avaliativo diferente ajudou aos alunos que desenvolvem melhor em uma atividade específica. Apesar de importante para a aprovação perante a instituição de ensino, não vejo tanta relevância na nota em si, considero importante o aprendizado do aluno, ele pode não conseguir expressar seu aprendizado por métodos avaliativos específicos, tanto que deixei em aberto muitos prazos de entrega até o último dia. Considerei algumas questões não pelo certo ou errado da minha percepção, mas sim pelo modo de entender que o aluno expressou, cada um tem uma maneira particular de expressar seu conhecimento.

Assim como o aluno tem vários modos de expressar seu aprendizado, também tem vários modos de aprender, considerando isto levei para sala de aula diferentes materiais didáticos para auxiliar nas aulas, o que se possível irei levar para as aulas futuras se continuar a lecionar.

Outro ponto importante foi fazer a relação com o cotidiano do aluno, este método gerou um aumento no interesse, assimilação e participação dos alunos, através desta metodologia o aluno vê sentido em aprender, aproxima a História da sua vida, ele não vê apenas o conteúdo com aquela ideia clássica dos alunos de “para que estudar História?”.

Após a conclusão do estágio posso afirmar que as propostas dos autores utilizados são aplicáveis em sala de aula, muitas delas podendo ser melhores trabalhadas em uma situação real de docência, com mais tempo disponível. Apesar de importante e essencial para a formação docente, ainda acredito haver muitos problemas na estruturação dos estágios, como o que apresentei sobre a coparticipação, a preparação dos planos de aula com muita antecedência ao estágio, pois muito do que é pensado na construção do material pode haver a necessidade de alterar após contato com o aluno.

Referências

FREIRE, P. Pedagogia da Autonomia. 31.ed. São Paulo: Editora Paz e Terra S/A, 2005;
FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido. 10. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981;
PINSKY, J.; PINSKY, C. B. Por uma história prazerosa e consequente. IN: KARNAL, L. (org.) História na sala de aula: conceitos, práticas e propostas. São Paulo: Contexto, 2005;
SCHMIDT, M. A. A formação do professor de História e o cotidiano em sala de aula. IN: BITTENCOURT, C. (org.) O saber histórico na sala de aula. 2.ed. São Paulo: Contexto, 1998;
SCHMIDT, M. A.; CAINELLI, M.  Ensinar História. São Paulo: Editora Scipione, 2005;
SEFFNER, F. Desenhando o perfil de um bom professor/uma boa professora de ensino de história: faça a crítica da lista de critérios que segue, e acrescente suas opiniões. In: BUENO, André; CREMA, Everton e ESTACHESKI, Dulceli. Tecendo Amanhãs: O ensino de história na Atualidade. Rio de Janeiro/União da Vitória: Edição Especial Sobre Ontens, 2015. Disponível em:
 http://simpohis.blogspot.com.br/p/fernando-seffner.html. Acessado em: 20/11/2015;
SEFFNER, F. Teoria, metodologia e ensino de História. In: Questões de teoria e metodologia da História. Porto Alegre: UFRGS, 2000. p.257-288;

TURINI, L. A. A crítica da história linear e da idéia de progresso: um dialogo com Walter Benjamin e Edward Thompson. Educação e Filosofia, v. 18, n. 35/36, p. 93-125, jan./dez. 2004.

4 comentários:

  1. Como fica a formação dopensamento autonomo freiriano, tendo em vista o planejamento de aula docente?
    att,
    Emerson Caldas

    ResponderExcluir
  2. Boa noite Emerson, no planejamento, como ele foi feito antes dos primeiros diálogos com os alunos ele ficou justamente nisso "desenvolver o diálogo com os alunos". É na prática que ele é melhor desenvolvido com a participação dos discentes, de acordo com que vai conhecendo o aluno se torna possível desenvolver este pensamento autônomo.

    ResponderExcluir
  3. Bom dia!
    Parabéns pelo texto, sobre o olhar em visão ao processo do estudo da história, observado no período de estagio.Concordo com você que o professor deve ter metodologia de ,absorver conhecimentos com os alunos.Porém, o que se observa e que muitos professores estão mas ligados em seguir a ordem cronológica dos assuntos, do que problematizar os conteúdos.Seria para muitos ainda que a historia e "decorra", e estabelecer somente a transposição de conhecimento, do que, a mediação didática.
    Cintia Patricia E. Vasconcelos

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Obrigado Cintia, acho também que muito dessa preferência por manter a ordem cronológica se deve ao comodismo. Pegar o material quase pronto no caso de alguns professores mais antigos que acabaram se acomodando ou um material disponível em livro didático e internet para os mais novos e só querem terminar logo determinado conteúdo :x

      Excluir

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.